sábado, 25 de janeiro de 2020

MALANDROS - FAMILIA DA MALANDRAGEM


Os malandros têm como principal característica de identificação, a malandragem, o amor pela noite, pela música, pelo jogo, pela boemia e uma atração pelas mulheres (principalmente pelas prostitutas, mulheres da noite, etc..). Isso quer dizer que em vários lugares de culturas e características regionais completamente diferentes, sempre haverá um malandro. O malandro de Pernambuco, dança côco, xaxado, passa a noite inteira no forró; no Rio de Janeiro ele vive na Lapa, gosta de samba e passa suas noites na gafieira. Atitudes regionais bem diferentes, mas que marcam exatamente a figura do malandro.

No Rio de Janeiro aproximou-se do arquétipo do antigo malandro da Lapa, contado em histórias, músicas e peças de teatro. Alguns quando se manifestam se vestem a caráter. Terno e gravata brancos. Mas a maioria, gosta mesmo é de roupas leves, camisas de seda, e justificam o gosto lembrando que: “a seda, a navalha não corta”. Navalha esta que levavam no bolso, e quando brigavam, jogavam capoeira (rabos-de-arraia, pernadas), às vezes arrancavam os sapatos e prendiam a navalha entre os dedos do pé, visando atingir o inimigo. Bebem de tudo, da Cachaça ao Whisky, fumam na maioria das vezes cigarros, mas utilizam também o charuto. São cordiais, alegres, dançam a maior parte do tempo quando se apresentam, usam chapéus ao estilo Panamá. 

Podem se envolver com qualquer tipo de assunto e têm capacidade espiritual bastante elevada para resolvê-los, podem curar, desamarrar, desmanchar, como podem proteger e abrir caminhos. Têm sempre grandes amigos entre os que os vão visitar em suas sessões ou festas. 

Existem também as manifestações femininas da malandragem, Maria Navalha é um bom exemplo. Manifesta-se como características semelhantes aos malandros, dança, samba, bebe e fuma da mesma maneira. Apesar do aspecto, demonstram sempre muita feminilidade, são vaidosas, gostam de presentes bonitos, de flores principalmente vermelhas e vestem-se sempre muito bem. 

Ainda que tratado muitas vezes como Exu, os Malandros não são Exus. Essa ideia existe porque quando não são homenageados em festas ou sessões particulares, manifestam-se tranquilamente nas sessões de Exu e parecem um deles. Os Malandros são espíritos em evolução, que após um determinado tempo podem (caso o desejem) se tornarem Exus. Mas, desde o início trabalham dentro da linha dos Exus. 

Pode-se notar o apelo popular e a simplicidade das palavras e dos termos com os quais são compostos os pontos e cantigas dessas entidades. Assim é o malandro, simples, amigo, leal, verdadeiro. Se você pensa que pode enganá-lo, ele o desmascara sem a menor cerimônia na frente de todos. Apesar da figura do malandro, do jogador, do arruaceiro, detesta que façam mal ou enganem aos mais fracos. Salve a Malandragem! 

Na Umbanda o malandro vem na linha dos Exus, com sua tradicional vestimenta: Calça Branca, sapato branco (ou branco e vermelho), seu terno branco, sua gravata vermelha, seu chapéu branco com uma fita vermelha ou chapéu de palha e finalmente sua bengala. 
Gosta muito de ser agradado com presentes e festas, ter sua roupa completa, é muito vaidoso, tem duas características marcantes: 
1. Uma é de ser muito brincalhão, gosta muito de dançar, gosta muito da presença de mulheres, gosta de elogiá-las etc... 
2. Outra é ficar mais sério parado num canto assim como sua imagem, gosta de observar o movimento ao seu redor, mas, sem perder suas características. 

Às vezes muda um pouco, pede outra roupa, um terno preto, calças e sapatos também pretos, gravata vermelha e às vezes até cartola. Em alguns terreiros ele usa até uma capa preta. 
E outra característica dele é continuar com a mesma roupa da direita, com um sapato de cor diferente, fuma cigarros, cigarrilhas ou até charutos, bebe batidas, pinga de coquinho, marafo, conhaque e uísque, rabo-de-galo; é sempre muito brincalhão, extrovertido. 

Seu ponto de força é na subida de morros, esquinas, encruzilhadas e até em cemitérios, pois ele trabalha muito com as almas, assim como é de característica na linha dos pretos velhos e exus. Sua imagem costuma ficar na porta de entrada dos terreiros, pois ele também toma conta das portas, das entradas, etc...

São muito conhecidos por sua irreverência. Suas guias podem ser de vários tipos, desde coquinhos com olho de Exu, até vermelho e preto, vermelho e branco ou preto e branco. 

UMA DAS HISTÓRIAS DE ZÉ PILINTRA DAS MILHARES CONTADAS

José dos Anjos, nascido no interior de Pernambuco, era um negro forte e ágil, grande jogador e bebedor, mulherengo e brigão. Manejava uma faca como ninguém, e enfrentá-lo numa briga era o mesmo que assinar o atestado de óbito. Os policiais já sabiam do perigo que ele representava. Dificilmente encaravam-no sozinhos, sempre em grupo e mesmo assim não tinham a certeza de não saírem bastante prejudicados das pendengas em que se envolviam. 

Não era mal de coração, muito pelo contrário, era bondoso, principalmente com as mulheres, as tratava como rainhas. 

Sua vida era à noite. Sua alegria, as cartas, os dadinhos a bebida, a farra, as mulheres e por que não, as brigas. Jogava para ganhar, mas não gostava de enganar os incautos, este sempre dispensava, mandava embora, mesmo que precisasse dar uns cascudos neles. Mas ao contrário, aos falsos espertos, os que se achavam mais capazes no manuseio das cartas e dos dados, a estes enganavam o quanto podia e os considerava os verdadeiros otários. Incentivava-os ao jogo, perdendo de propósito quando as apostas ainda eram baixas e os limpando completamente ao final das partidas. Isso bebendo aguardente, cerveja, Vermont, e outros alcoólicos que aparecessem. 

ZÉ PILINTRA NO CATIMBÓ DO CATIMBÓ JUREMA

No Nordeste do país, mas precisamente em Recife (na religião que conhecemos como Catimbó), ainda que nas vestes de um malandrão, a figura de Zé Pelintra, tem uma conotação completamente diferente. Lá, ele é doutor, é curador, é Mestre e é muito respeitado. Em poucas reuniões não aparece seu Zé. 

O reino espiritual chamado “Jurema” é o local sagrado onde vivem os Mestres do Catimbó, religião forte do Nordeste, muito aproximada da Umbanda, mas que mantém suas características bem independentes. Na Jurema, Seu Zé, não tem a menor conotação de Exu, a não ser quando a reunião é de esquerda, por que o Mestre tem essa capacidade. Tanto pode vir na direita ou na esquerda. Quando vem na esquerda, não é que venha para praticar o mal, é justamente o contrário, vem revestido desse tipo de energia para poder cortá-la com mais propriedade e assim ajudar mais facilmente aos que vem lhe rogar ajuda. 
No Catimbó, Seu Zé usa bengala, que pode ser qualquer cajado, fuma cachimbo e bebe cachaça. Dança coco, Baião e Xaxado, sorri para as mulheres, abençoa a todos, que o abraçam e o chamam de padrinho. 

NOMES DE ALGUNS MALANDROS

1. Zé Pilintra
2. Zé Malandro 
3. Zé do Coco 
4. Zé da Luz 
5. Zé de Légua 
6. Zé Moreno 
7. Zé Pereira 
8. Zé Pretinho 
9. Malandrinho 
10. Camisa Listrada
11. Miguel Malandro
12. Sete Navalhadas 
13. Antônio Malandro 
14. João Malandro

NOMES DE ALGUMAS MALANDRAS: 

1. Maria do Cais 
2. Maria Navalha 
3. Rosa Malandra
4. Selma Malandra

O PERFIL DOS MALANDROS:

Falamos até agora sobre os Orixás, quem são eles, sobre algumas de suas características e falamos também sobre os Guias ou Entidades, mas de uma maneira geral. Agora a disposição é falar um pouco mais sobre determinados Guias ou Entidades, e as suas maneiras peculiares de trabalho.

Zé Pelintra é uma das entidades que tem um dos comportamentos mais exóticos e interessantes que já pude presenciar: ZÉ PELINTRA! Antes de começar a discorrer sobre o que se conhece desse malandro incorrigível, mulherengo, birrento, arruaceiro, mas de um coração enorme, é preciso que se entenda que toda entidade, tem uma história, uma cultura, pois foi tão humano quanto nós quando encarnada. 

Após o desencarne e a consequente espiritualização, poderá ocorrer que sua manifestação venha a se dar em outros centros regionais diferentes do que consta em sua biografia humana e assim, quando manifestada, poderá demonstrar outras culturas que não as de sua procedência humana. Isso quer dizer que a mesma entidade poderá manifestar-se diferentemente em lugares diferentes, sem que isso implique em mistificação. Tal fato acontece porque, pela necessidade do ingresso nas falanges espirituais, afim de prestar seu trabalho nesta nova roupagem, os espíritos, agora desencarnados, aproximam-se desta ou daquela falange, por simpatia ou determinação superior, mas guardam características bastante marcantes de suas existências materiais.

Melhor entendendo: Zé Pelintra tem como característica principal, a malandragem, o amor pela noite. Tem uma grande atração pelas mulheres, principalmente pelas prostitutas, mulheres da noite, além de outras características que marcam a figura do malandro. Isso quer dizer que em vários lugares, de culturas e características regionais completamente diferentes, sempre haverá um malandro. O malandro de Pernambuco, dança côco, xaxado, passa a noite inteira no forró; No Rio de Janeiro ele vive na Lapa, gosta de samba e passa suas noites na gafieira. Atitudes regionais bem diferentes, mas que marcam exatamente a figura do malandro. Isso bem explicado, vamos conhecer mais de perto esse grande camarada. Conheçam essa maravilhosa entidade: " SEU ZÉ " José Gomes da Silva, nascido no interior de Pernambuco, era um negro forte e ágil, grande jogador e bebedor, mulherengo e brigão. Manejava uma faca como ninguém, e enfrentá-lo numa briga era o mesmo que assinar o atestado de óbito. Os policiais já sabiam do perigo que ele representava. Dificilmente encaravam-no sozinhos, sempre em grupo e mesmo assim não tinham a certeza de não saírem bastante prejudicados das pendengas em que se envolviam. Não era mal de coração, muito pelo contrário, era bom, principalmente com as mulheres, as quais tratava como rainhas. Sua vida era a noite, sua alegria as cartas, os dadinhos a bebida, a farra, as mulheres e por que não, as brigas. Jogava para ganhar, mas não gostava de enganar os incautos, a estes sempre dispensavam, mandava-os embora, mesmo que precisasse dar uns cascudos neles. Mas ao contrário, aos falsos espertos, aos que se achavam mais capazes no manuseio das cartas e dos dados, a estes enganava o quanto podia e os considerava verdadeiros otários. Incentivava-os ao jogo, perdendo de propósito inicialmente, quando as apostas ainda eram baixas e os limpando completamente ao final das partidas. Isso bebendo Aguardente, Cerveja, Vermont, e outros alcoólicos que aparecessem. Esta entidade anda pelo mundo todo, suas manifestações apresentam-se em todos os cantos da terra. A pouco se teve notícia pelos diários, de uma médium que o incorporava nos Estados Unidos. No Rio de Janeiro aproximou-se do arquétipo do antigo malandro da Lapa, contado em histórias, músicas e peças de teatro. Alguns quando se manifestam, vestem-se a caráter. Terno e gravata brancos. Mas a maioria gosta mesmo é de roupas leves, camisas de seda, e justificam o gosto lembrando que a seda, a navalha não corta. Bebem de tudo, da Cachaça ao Whisky, fumam na maioria das vezes cigarros, mas utilizam também o charuto. São cordiais, alegres, dançam a maior parte do tempo quando se apresentam, usam chapéus ao estilo Panamá. Podem se envolver com qualquer tipo de assunto e têm capacidade espiritual bastante elevada para resolvê-los, podem curar, desamarrar, desmanchar, como podem proteger e abrir caminhos. Têm sempre grandes amigos entre os que os vão visitar em suas sessões ou festas. Existem também as manifestações femininas da malandragem: Maria Navalha é um bom exemplo. Manifestam-se como características semelhantes aos malandros, dançam, sambam, bebem e fumam da mesma maneira. Apesar do aspecto rude, demonstram sempre muita feminilidade, são vaidosas, gostam de presentes bonitos, de flores, principalmente as rosas vermelhas e vestem-se sempre muito bem. Ainda que tratado muitas vezes como Exu, Zé Pelintra não é Exu. Essa ideia existe porque quando não são homenageados em festas ou sessões particulares, manifestam-se tranquilamente nas sessões de Exu e se parecem com eles. Há um ponto inclusive que lembra muito essa amizade entre Exus e Zé Pelintras. Tranca Ruas e Zé Pelintra São dois grandes companheiros, Tranca Ruas na Encruza, E Zé Pelintra no Terreiro. No Nordeste do Pais, mas precisamente em Recife, ainda que nas vestes de um malandrão, a figura de Zé Pelintra, tem uma conotação completamente diferente. Lá, ele é doutor, é curador. É Mestre e é muito respeitado. Em poucas reuniões não aparece seu Zé. Lá vem Zé, lá vem Zé, Lá vem Zé, lá da Jurema. Lá vem Zé, Lá vem Zé, Lá vem Zé do Juremá. A Jurema aqui cantada, é o local sagrado onde vivem os Mestres do Catimbó, religião forte do Nordeste, muito aproximada da Umbanda, mas que mantém suas características bem independentes. Na Jurema, Seu Zé, não tem a menor conotação de Exu, a não ser quando a reunião é de esquerda, por que o Mestre tem essa capacidade, tanto pode vir na direita quanto na esquerda. Quando vem na esquerda, não é que venha para praticar o mal, é justamente o contrário, vem revestido desse tipo de energia para poder cortá-la com mais propriedade e assim ajudar mais facilmente aos que vem lhe rogar ajuda. No Catimbó, Seu Zé usa bengala, que pode ser qualquer cajado, fuma cachimbo e bebe cachaça. Dança Côco, Baião e Xaxado, sorri para as mulheres, abençoa a todos, que de maneira carinhosa e respeitosa o abraçam, chamando-o de " Meu Padrinho ". Assim é nossa querida Umbanda, seus guias e entidades podem se manifestar em qualquer cultura mantendo sua individualidade. Dão chance dessa maneira, de que qualquer um, em qualquer lugar que esteja, possa ter a oportunidade de conhecê-los e usufruir de seus poderes e força espiritual. 

Alguns pontos demonstram essa ligação de Seu Zé com a malandragem, a noite e as mulheres. Pode-se notar o apelo popular e a simplicidade das palavras e dos termos com os quais são compostos os pontos e cantigas dessa entidade. Assim é ele, simples, amigo, leal, verdadeiro. Se você pensa que pode enganá-lo, ele o desmascara sem a menor cerimônia na frente de todos. Apesar da figura do malandro, do jogador, do arruaceiro, detesta que façam mal ou enganem aos mais fracos. Sempre que estiver no aperto, grite por Seu Zé, ele com certeza estará bem próximo para lhe ajudar. Salve a Malandragem!

PONTOS CANTADOS DE MALANDROS - ZÉ PILINTRA

Cantos
I
De manhãzinha, quando vem descendo o morro 
A nega pensa, que ele vai trabalhar
Ai ele põe seu baralho no bolso 
Cachecol no pescoço 
E vai pra Barão de Mauá
Trabalhar, trabalhar pra que 
Se ele trabalhar ele vai morrer

II
Chorou, todo morro chorou 
Chorou, chorou de dor
Chorou quando a notícia correu 
Que malandro Zé Pilintra morreu

III
O morro de Santa Tereza está de luto 
Porque Zé Pilintra morreu
Ele chorava por uma mulher 
Ele chorava por uma mulher 
Ele chorava por uma mulher que não lhe amava 

IV
As quatro da madrugada 
Ela me acorda 
E eu não quero nada
Mas qualquer dia 
Eu quebro esse seu despertador 
Mas trabalhar eu não vou 

V
Estava sentado no muro 
Fumando um bagulho 
E a polícia chegou 
Jogou o bagulho pro alto 
Saiu no pinote 
E ninguém lhe pegou 
Ouve tiroteio, ouve confusão 
Varou na porta um camburão 

VI
Estava preso no xadrez 
Quando sua sentença 
Era de um ano e seis meses
Rosinha foi lhe visitar 
Levando a muamba 
Pro malandro fuma

VII
Ô Zé quando vem lá da lagoa
Toma cuidado com o balanço da canoa 
Ô Zé, faça tudo o que quiser
Mas não maltrate o coração dessa mulher 

VIII 
Zé Pelintra, Zé Pelintra 
Negro do chapéu virado
Quem mexer com Zé Pelintra 
Tá doido ou tá danado 

IX 
Mulher, mulher
Não tenha medo do seu marido (bis) 
Se ele é bom na faca 
Eu sou no facão
Se ele é bom na reza 
Eu na oração
Se ele diz que sim 
Eu digo que não
Eu sou Zé Pelintra 
Ele é lampião 

X
Jogou seu limão pro alto 
Aparou com canivete
Em rodada de malandro 
Cagoeta não se mete 

XI
Jogou seu limão pro alto 
Aparou com seu punhal 
Em rodada de malandro 
Cagoeta se dá mal

XII
Juraram de me matar 
Na porta de um cabaré (bis) 
Passo de noite 
Passo de dia 
Não matam porque não quer (bis) 

XIII
Foi Zé quem cortou o pau 
Foi Zé quem fez a jangada 
Foi Zé quem matou a moça 
E jogou seu corpo na encruzilhada. 
Embarca morena embarca 
Embarca neste vagão 
Se não for na barca nova 
Na outra eu também não vou. 

XIV 
Malandro não assalta de dia 
Malandro assalta de madrugada (bis) 
Olha que Zé é Zé 
Malandro é malandro 
E Mané é Mané (bis) 

XV
Dizem que a mulher 
Mata o homem lentamente 
É por isso que vivo entre elas 
Pra não morrer de repente 

XVI
Eu tenho pena sua dona 
Eu tenho dó (bis) 
De ver o galo preto 
Demandar com o carijó (bis) 

XVII 
Eu tava sentado na praça 
Oi quando a polícia chegou (bis) 
Eu tenho um sentimento profundo 
Eu fui fichado na polícia como vagabundo (bis) 

XVIII
Morena linda 
Por que me olhas 
Se não me quer 
Não me namora 

ROSA MALANDRA 
Cantos
I
No jardim de aueira 
Ela vem beber 
Garrafão de vinho 
Bebe aqui, bebe aculá (bis) 
Ela é Rosinha beberrona 
E não promete pra faltar (bis) 

II
Ah não mexa com ela não 
Ela é ponta de agulha 
Quem mexer com a Rosinha 
Vai morar na sepultura (bis) 

II
Toda malandra que se preza 
Não tem hora pra chegar 
Faz da rua sua prece 
Da encruza seu altar (bis) 

III
Ela malandra tem relógio
Mas não sabe ver a hora 
É por isso que ela malandra 
Só bebe fora de hora (bis) 

IV
É rosa, é rosa, é rosa 
É rosa que ninguém tem 
Chegou ela Rosa Malandra 
Da porta do cabaré (bis) 

V
Ela é malandra sim 
Foi a maior pistoleira da Bahia 
Ela é malandra 
E não nega a malandragem 
Na malandragem 
Aprendeu a se defender (bis) 

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

ROSALINA, COBRA GRANDE DA LAGOA



Dona Rosalina é uma cobra imensa de couro negro, que deve medir de 8 a 10 metros. Mas, da cintura para cima é uma moça morena, de cabelos negros, que tem uma pedra azul encravada na fronte. É uma princesa. 
Mora numa lagoa, próximo a uma cabana, onde ela se encontra com sua filha Rosinha, uma menina muito parecida com ela. É quando sai da lagoa que ela se transforma, ficando, pra cima, uma princesa muito bonita e, pra baixo, uma cobra. Às vezes, fica enrolada em algum tronco na beira da lagoa, em pés de ingá (fruta de beira de campo). Depois sai, se arrastando com muita dificuldade, se metamorfoseia e entra na cabana. Alí conversa com a menina e faz tudo o que uma mãe pode fazer com uma filha. Seu processo de transformação é muito lento e penoso, e se repete todos os anos. Um dia ela explicou a Dona Yolanda por que tinha acontecido aquilo com ela, falou o que tinha acontecido para ela ficar assim. 
Rei Camundá tinha várias filhas. Rosalina era a mais velha. Um dia ela ficou grávida, se envolveu com um homem sem o consentimento do pai. Naquela época, não se sabe em que século foi, era muito complicado quando uma princesa engravidava de uma pessoa que não era da sua linhagem. Ela então escondeu a gravidez, com medo da reação do pai. Quando ele soube que ela estava grávida, ela já estava nos dias de ter a criança. 
Ela teve a criança, aquela meninazinha, que ela encontra na cabana da lagoa. Mas seu pai, que era um rei com muitos poderes mágicos, depois disso transformou todas as suas princesas em feras. Suas outras filhas também, para evitar que acontecesse com elas a mesma coisa, transformou todas em cobras. Todas são de uma só família e foram transformadas em cobra pelo pai. Ele sabia que assim nenhum homem ia se aproximar delas. 
Rosalina se refugiou numa lagoa. Uma vez por ano, tinha permissão para visitar a filha que morava na cabana. Da lagoa, Rosalina via a menina brincar e fazer todas as coisas. Suas irmãs se espalharam pelo mundo, uma foi para a Grécia. Uma delas era muito bonita, a cobra Coral, também chamada Princesa da Pedra Fina. Outra, a Cobrinha Verde, era muito pequena. Tinha também a Princesa Cora, a Jibóia Branca, e outras mais. Uma delas, a Boiúna, é muito revoltada. Elas acharam que seu pai foi muito mau, transformando-as em cobra, pois quando chegam em um lugar não podem ser bem recebidas. Quem quer uma cobra em sua casa? Ninguém. Então a mais revoltada delas, a Cascavel, tornou-se muito violenta, muito agressiva e muito venenosa (o veneno era uma reação ao mal que havia recebido do pai). 
Por causa de sua maldade, o rei Camundá “perdeu a patente” e foi transformado no Preto Velho “Camundá”, que está encantado no mar. Não se sabe quem é o pai de Rosinha, talvez seja algum índio.



quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

ENCANTARIA E SEUS MISTÉRIOS


 
“Quando os nagôs chegaram, já tinha aqui trabalhos de pajelança, coisa de encantaria, o espaço “celeste” já era habitado, e como agradecimento por serem recebidos nessa terra estranha, acolheram esses visitantes na virada pra mata, quando se interrompe a louvação às entidades africanas e o tambor “vira”, permitindo a manifestação dos caboclos, que então cantam em português.

Encantados no mar, nas matas, Ilhas, croas, árvores, rios, pedras e serras, formam uma outra geografia maranhense que elimina os limites do espaço físico e mítico. A praia dos Lençóis, a Ilha dos Caranguejos e a pedra de Itacolomi são a moradas de encantados onde todo mundo vai passear. Transformam o tempo cronológico em “social”, onde figuras das mais diferentes épocas e países se encontram e se relacionam. Vencem a morte desaparecendo “vivos” no momento do encante, e suas biografias continuam em construção. Burlando conceitos como céu e terra, vida e morte, santos e pecadores, os caboclos realizam plenamente no plano espiritual a miscigenação étnica brasileira, com a naturalidade desconcertante de uma religião voltada para a ancestralidade.

Fidalgos europeus, cristãos, turcos, judeus, ciganos, índios, piratas, boiadeiros, pretos velhos, princesas, marinheiros, mães d’água, botos, caboclos mestiços vindos de toda parte, na Mina “desce todo tipo de gente”. São várias linhas, nações e regiões que se Interligam e interrelacionam em inúmeras variantes.

Rei da Turquia, o Ferrabrás de Alexandria da História do Imperador Carlos Magno e os doze pares de França, chefia uma família imensa de encantados, da qual fazem parte outros personagens dessa estória como seu cunhado Guy de Borgonha e sua irmã Floripes, que chefia os Borgonhas, um dos três ramos da família Turquia.

“Seu” Turquia veio para o Brasil no navio encantado e seu primo D. João, o fidalgo português, após ser derrotado na guerra dos cristãos contra os mouros. No entanto, ao portar no Outeiro da Cruz, onde o navio era visto por muitos nas festas do Terreiro do Egito, D. João zarpou deixando lá seu primo, que andando pelas imediações chegou na aldeia em festa de Caboclo Velho, Rei dos Caboclos, o primeiro a “bradar” no Tambor de Mina, de família numerosa e chefe da linha de Jurema Branca. Convidado por este, estabeleceu-se ali tornando-se seu grande amigo, onde adotaram filhos um do outro, ficando tão ligados que os Ramos, outra das famílias turcas, são chefiados por Caboclo Velho, e vários filhos do Rei da Turquia adotaram nomes indígenas como Juracema, guia de Pai Euclides, seu irmão Jaguarema, um anti-cristão convicto que zomba dos santos, Iracema e Ubirajara, no melhor estilo romântico indigenista.

Tabajara, outro filho de”Seu” Turquia que é o chefe dos caboclos na Casa Fanti Ashanti, lutou na guerra do Paraguai, onde ferido em combate foi socorrido pela índia Bartira, com quem se casou. Bartira por sua vez é irmã da Cabocla Jurema, cearense, e grande amiga de Balanço das Águas, nobre português filho do Barão de Guaré, que desentendendo-se com sua família veio para o grupo dos turcos a convite dela. A terceira grande família dos turcos, os Ferrabrás, são chefiados por Douro, a francesa Joana D'Arc, filha adotiva do Rei da Turquia.              

Rei Sebastião, o Rei português desaparecido em Alcácer-Quibir é dos encantados mais antigos da Mina, tem seu reino encantado submerso na praia dos Lençóis, onde acredita-se que se desencantar “porá abaixo o Maranhão”.

Légua Boji, chefe do Terecô - Tambor da Mata, religião da região de Codó, interior maranhense - é um vodum cambinda que entrou na mata. Antônio Luís, o  Corre-Beirada, “farrista” de Pai Euclides que comanda o Bumba-boi da casa, um filho de D. Luís Rei de França que deixou o trono pela boemia.

Rei Surrupira do Gangá é o chefe de outra grande família de indígenas, que também vêm como caboclos, e tem um ritual bastante complexo específico para eles: O Canjerê, ou tambor de Borá.

Todas essas estórias e inúmeras outras refletem a imensa teia de relações sociais da comunidade “do santo”. Pai Euclides Talabyan, chefe da casa, é um babalorixá internacionalmente conhecido, autor de três livros sobre cultura afro-brasileira e iniciador de dezenas de país de santo espalhados por todo o Brasil. Chefia com esmero a enorme família dos filhos, sobrinhos e netos de santo, de sangue e de afinidade, que junto com os voduns e encantados que carregam engendram uma convivência social que não só harmoniza de maneira tão complexa quanto natural os planos social e espiritual, mas também permite a eles exercerem seus talentos de músicos, dançarinos, cantores excelentes que são.

A Casa Fanti Ashanti, em atividade, desde 1954, é um verdadeiro centro de cultura popular maranhense, onde num calendário anual repleto, se realizam com capricho e rigor uma grande quantidade de manifestações sagradas e profanas como os toques de Tambor de Mina, Candomblé, Cura/Pajelança, Baião de Princesas, Samba Angola, Mocambo, Bancada, Avaninha, Encruzo, tambor de choro, almoço dos cachorros, tambor de crioula, tambor de taboca, bumba-boi de baixada, carimbó de caixa, queimação de palhinhas, festa do Divino, ladainhas, procissões e inúmeros outros rituais internos.

Os cantos são chamados doutrinas, são de uma clareza surpreendente. São melodias matrizes da nossa música popular, pequenas contas que como os Cocos, Sambas de Roda e outros cantos, formam esse fio que nos guia e nos protege.”

Casa das Minas

A Casa das Minas é um dos templos afro-brasileiros mais tradicionais, sendo talvez um dos únicos que se consideram basicamente jeje (Fon), e que, de acordo com investigações realizadas há mais de trinta anos por Octávio da Costa Eduardo (1948), relaciona-se provavelmente com a família real de Abomey, capital do antigo Reino do Daomé , na atual República Popular do Benin. Estabelecida em São Luís do Maranhão, na primeira metade do século XIX, a Casa das Minas é um dos mais antigos terreiros de cultos afro-brasileiros, possuindo grande prestígio no meio religioso afro-maranhense. Este prestígio faz com que ela seja respeitada, temida e talvez por isso mesmo pouco conhecida. É considerada a casa-mãe de outros terreiros de tambor de mina do Maranhão e da Amazônia, constituindo-se num dos modelos de organização religiosa afro-brasileira.

Atualmente a Casa das Minas possui cerca de uma dezena de vodunsi ou filhas-de-santo, quase todas com mais de 60 anos de idade. Um número reduzido, se comparado à maioria dos outros grupos de tambor de mina, ou com aquele encontrado na própria casa: à época de mãe Andresa, por exemplo, chegava-se a ter numa mesma festa mais de cinqüenta vodunsi, diversas delas filhas-de-santo desde criança.

Em relação às mudanças, fala-se que a casa é muito conservadora, não aceitando inovações em seus rituais. As vodunsi dizem que não querem que a casa se transforme num terreiro beta, ou num centro de umbanda, e não aceitam entre elas pessoas que recebam caboclos, mas apenas as que têm um vodum jeje-nagô. Ainda segundo a tradição, as filhas da casa não podem ter dançado antes em outros terreiros e até mesmo os tocadores de lá não podem tocar em outras casas, “para não misturar o toque”. Fala-se que antigamente as chefes das outras casas mandavam para lá os que tinham vodum jeje, como até hoje as de lá continuam mandando procurar outras casas aos que não têm vodum de lá. Embora comente-se que, atualmente, as outras casas já não procedam mais assim, querendo ter entre seus filhos-de-santo pessoas que se dizem com santo jeje, considerado mais nobre e de maior prestígio no meio religioso.

Nos últimos vinte anos, entraram na Casa das Minas, como vodunsi, apenas cerca de meia dúzia de pessoas. Destas, três não freqüentam a casa pois “foram entregadas”, como se diz, por terem antes freqüentado outros terreiros, tendo, com isso, sofrido várias doenças,  principalmente doenças mentais. Entre as outras três vodunsi, uma que também estava louca morreu logo, outra vive fora e comenta-se que pretende abrir uma casa no lugar onde vive, o que é considerado pelo grupo como uma heresia. Apenas uma delas dança regularmente, há uns quinze anos, sendo considerada novata e inexperiente. Há mais de vinte anos também não se têm realizado “festas grandes”, com o oferecimento dos sacrifícios de animais a todas as atividades da casa, o que é muito dispendioso. Sempre há um pretexto para que se adie a festa para outra oportunidade. Alegam, por exemplo, que não podem assumir todas as despesas com a festa, ou então que morreu uma das vodunsi, estando a casa de luto, ou que uma pessoa importante da casa encontra-se doente. Há ainda outras justificativas, como a proximidade com a data prevista para outra festa muito trabalhosa, ou o estado de saúde da pessoa que lidera o grupo, o que a impediria de participar. Enfim, sempre há um pretexto. A despeito deles, as vodunsi dizem que apreciam fazer uma festa grande para que venham novas filhas, mas, ao mesmo tempo, evitam fazê-la, apesar de saberem que há pessoas amigas dispostas a colaborar nas despesas.

Algumas vodunsi dizem que houve no passado tentativas de fechar a casa, mas que ninguém sabe fazê-lo, pois as fundadoras africanas não ensinaram. Outras dizem que a casa não pode ser fechada e que o grupo delas não vai acabar. Dizem também que quando todas morrerem, se  não tiverem continuadoras, a casa ficará para o Estado, que poderá transformá-la numa escola ou num museu. Recentemente, ao término de uma  festa, observamos uma das vodunsi derramando água, do quarto dos santos, no local onde se sentam os tocadores, dizendo que elas estão necessitando de novos tocadores. Atualmente duas filhas, embora semi-analfabetas, estão freqüentando um curso de francês e um curso de  extensão na universidade, sobre língua e cultura Fon. Elas têm a intenção de, com alguma ajuda de fora, irem à África, pois pretendem aprender lá alguns rituais que foram perdidos pelo grupo. Os vodunsi consultados dizem que elas podem ir e aprovam tal iniciativa, mas são de opinião que, provavelmente, não irão mais encontrar o que procuram, e que na própria casa elas têm tudo de que precisam.

Em 1974, uma chefe do grupo, já falecida, sem consultar as demais vodunsi, doou algumas peças da casa, inclusive um tambor grande, para um museu que estava sendo organizado pelo governo, em troca de alguns consertos no prédio. Alguém comentou, referindo-se à pessoa e ao próprio grupo, que este gesto era como uma espécie de suicídio cultural. Nos últimos três ou quatro anos têm sido feitas reformas no prédio, com ajuda solicitada por pessoas do grupo e executadas com recursos provenientes de órgãos públicos. Atualmente tem crescido o interesse de pessoas de fora por esse grupo religioso, como resultado do afluxo turístico, parte pela divulgação da casa, feita por exemplo através de obras literárias, como Os tambores de São Luís, de Josué Montello, ou mesmo pela presença de estudiosos e pesquisadores interessados em religiões afro-brasileiras. Mas na sociedade, de modo geral, predominam preconceitos contra o tambor de mina, contra a Casa das Minas e contra outras manifestações congêneres, como coisa de negro e como algo malévolo.

Como constata Mundicarmo Rocha Ferretti, em pesquisa que está realizando atualmente com outro grupo de tambor de mina de São Luís, sobre valores do grupo expressos nos rituais de caboclos, os rituais do tambor de mina, como em geral dos cultos afro-brasileiros, parece que não se prestam bem a certos tipos de análises simbólicas de rituais. Por exemplo, do tipo das propostas por Turner (1972: 12/14), sobretudo no aspecto operacional ou na maneira em que os símbolos são utilizados pelo grupo, que descrevem e comentam inúmeros detalhes dos ritos, interpretando os seus significados. Nas religiões afro-brasileiras, sendo religiões iniciáticas, a maior parte das explicações dos sentidos simbólicos dos rituais é transmitida apenas durante os rituais de iniciação e costuma ser considerada como “um fundamento” secreto, ensinado só aos iniciados. Os demais não têm acesso a este conhecimento, e nestes grupos a pergunta geralmente é vista como mera curiosidade malsã. Muitos aspectos da religião são considerados como um mistério - como também ocorre, por exemplo, no catolicismo divulgado popularmente no Brasil, com o dogma da Santíssima Trindade ou com o conceito de Divino Espírito Santo. Nas religiões afro-brasileiras muitos ensinamentos e conhecimentos são também considerados como um mistério. No tambor de mina do Maranhão é comum o costume de não se dizer nem mesmo o nome das divindades e de nomeá-las por apelidos como Pedrinha, Joãozinho, o Branco, o Moço, Rei dos Mestres, Povo da Rua etc. Dizem que as mais velhas da Casa das Minas eram muito desconfiadas e não gostavam que as mais novas ouvissem suas conversas e que muitas vezes, para não serem entendidas, elas conversavam entre si em língua africana ou com muitas palavras jeje. As mais novas dizem mesmo que, devido a todo este segredo, muitos conhecimentos do grupo foram perdidos, ou não foram transmitidos. Elas comentam que nem tudo se pode dizer e que os negros, como os maçons, nunca dizem tudo o que sabem, pois saber é poder. Elas dizem que conhecem o significado dos cânticos, pois as mais velhas ensinaram, mas é um segredo que não pode ser revelado a todos. As palavras ditas nos rituais também são secretas, pois muitas servem para chamar as divindades. Se por um lado o grande número de segredos fez talvez com que o grupo perdesse certos conhecimentos, por outro lado, trata-se de uma estratégia de preservação do grupo e do que lhe é mais caro e importante, e, portanto, de uma estratégia de resistência cultural. Ao mesmo tempo, a preservação ciosa dos segredos parece que é um dos fatores responsáveis pelo grande prestígio da Casa das Minas no meio religioso afro-maranhense, pois ela é tida como a casa que mais preserva as tradições dos antepassados africanos no Maranhão.

Constatamos, pois, que na Casa das Minas a religião é preservada como uma estratégia de resistência do grupo, que por um lado resiste a inovações, não aceitando que as filhas-de-santo recebam caboclos e, ao mesmo tempo, que se adapta a certas circunstâncias, aceitando a colaboração de amigos na arrecadação de fundos para as festas, ou aceitando verbas públicas para a execução de consertos no prédio, pois a casa já passa a ser considerada como fazendo parte das tradições culturais da cidade. Em alguns aspectos há, portanto, uma estratégia de adaptação às circunstâncias, semelhante, por exemplo, à estratégia do socialismo de algumas modernas nações da África, em que convivem elementos do capitalismo e do socialismo. Trata-se de uma estratégia de procura de diálogo, de aceitação de algumas idéias do outro, procurando preservar alguns princípios mais profundos. É uma estratégia desenvolvida pelos dominados. Ao nível da consciência dos membros do grupo, a casa não muda, embora, ao nível da realidade, possam ser constatadas algumas mudanças pelo próprio grupo, como, por exemplo, a perda de certos rituais e a tentativa de reavê-los por uma inovação tradicionalista de uma volta à África, por exemplo. Pode vir a ocorrer na Casa das Minas o que ocorreu com a capoeira, que perdeu muito de suas características populares de espontaneidade, por interferência da política cultural do governo, que modificou inclusive sua filosofia (Areias, 1983: 68).   


Fontes:
Tambor de Mina: Texto de Renata Amaral (contatos: www.maraca.art.br/pedradamemoria / www.acervobarca.com.br / www.ponto.mus.br )
Bibliografia: A Casa Fanti-Ashanti e seu Alaxé / Euclides Menezes Ferreira. - São Luís : Ed. Alcântara, 1987
Desceu na Guma / Mundicarmo Ferretti. - São Luís : EDUFMA, 2000
Contatos: Casa Fanti-Ashanti - Rua Militar, 1158 - Cruzeiro do Anil - São Luís - Maranhão
Casa das Minas : Do texto de Sérgio Figueiredo Ferreti / Universidade Federal do Maranhão in Negro Brasileiro Negro organizado por Joel Rufino dos Santos. - Revista do Patrimônio Histórico e ArtísticoNacional, 1997

Por. Adriano Figueiredo Leite - Presidente da ACALUZ
Profº. Diego Bragança de Moura - Historiador da ACALUZ 

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Cabocla Herondina, uma Turca em Terras do Pará

Apresentação

A Associação Cultural Axé e Luz (ACALUZ) trás nesta terceira postagem um estudo mais abrangente da CABOCLA HERONDINA. Uma visão cultural de Família. Legado deixado em vida e que perpassou para encantaria como forma de aprendizado para raiz de cada estudo feito através das entidades turcas e do tempo compreendido entre vida e encante. Pela primeira vez estamos divulgando um vídeo em nosso site, que facilitará o estudo e aprendizagem. 

TAMBOR DE MINA FRAGMENTOS DE SUA ORIGEM


Em 1049, no Oriente, a primeira cruzada massacra os Turcos e toma Jerusalém, O Sultão Darsalam que significa “casa da Paz”, derrotado, envia suas três filhas: Mariana, Herondina e Jarina para África, em asilo na Mauritânia, as princesas, entretanto, nunca chegaram a África, pois a passagem pelo Estreito de Gibraltar, entraram numa dimensão diferente dos Encantados e foram parar na foz do rio Amazonas, chegando na aldeia do Caboclo velho, indígena onde Sumé um Encantado branco, que morava na aldeia a muito tempo vai embora prometendo voltar se fosse preciso Herondina encanta-se com a natureza e assumi a Jurema, assim tornando-se uma divindade turca Pindorama, forma-se assim o primeiro anel da cobra grande. As princesas vão até o baixo Maranhão e encontram Dom Sebastião, aquele mesmo que dizem que morreu na batalha de alcácer-quibir nas Cruzadas, o qual oferece a hospitalidade portuguesa à Turquia, uma vez que, Pindorama era colônia de Portugal, forma então segundo anel da cobra grande. 

Em 1719, Darsalam (que prometera lutar pelo seu povo foge para África atrás de suas filhas ou correndo e o mesmo fenômeno do Encantamento indo parar após quatro meses de sono na aldeia de caboclo velho). Vê os orixás e voduns (assim são chamados Encantados na Amazônia) acompanhando os escravos. Um vodun que estava à frente e que entrava nos terreiros para mostrar que as divindades africanas não deviam atender apenas ao povo africano, foi escolhido para fazer um filho numa escrava, cujo a cria chamou-se Anastácia, a qual fundou o primeiro tambor de mina de São Luís. 

Em 1889 para unificar o atendimento a todas as raças, convoca-se uma reunião com todos os Encantados de todas as etnias e Darsalam ver todas as raças reunidas dançando. Fechando desse modo o terceiro anel da grande cobra, Darsalam não ficou no Brasil, voltou para a Turquia onde de seu Palácio, até hoje, zela pelo seu povo. 

Como vimos, das filhas do Sultão Toy Darsalam, Herondina sobressai como a mais guerreira, independente e atrevida. Sua entrada na encantaria deu-se juntamente com a primeira leva de Turcos em busca de abrigo seguro nas terras da Mauritânia. Esta viagem nunca chegou ao destino, sendo eles levados ao portal tridimensional da encantaria. Ao chegar às terras encantadas brasileiras, não duvidou, embrenhou-se nas matas e foi a primeira turca a se ajuremar, ou seja, deixar os padrões turcos e se apossar da vivencia dos juremeiros. 

Já, nas terras encantadas de El Rei Dom Sebastião, nos Lençóis Maranhenses, a vida de ajuremada não se adaptou mais aos comportamentos de fidalguia, que provocou sua ida para o Reino de Dom João, Rei Junkal, que liderava guerreiros valentes bantus, encantados no oceano. No Junkal, Dona Herondina encontrou seu verdadeiro paraíso, de posse de uma grande região convive com os temerosos Fulupas, os surrupiras africanos, e seus animais sagrados: as misteriosas onças pintadas. Devido sua rebeldia, na época em que estava na África, seu pai o Sultão Dar Sa Allan, o teria deixado durante um longo período na aldeia de Camundá, cujas terras estão hoje na República Popular de Angola.

Os turcos continuaram com seus postos nas cidades do litoral. O conto do Maranhão, é que o Sultão Turco Darsalam, mantinha a esperança de reconquista das regiões perdidas. Sultão Darsalam resolve manter a chama do Sultanato salva com suas Filhas, as princesas Turcas (conhecidas no Brasil): Princesa Mariana – Princesa Herondina – Princesa Jarina. 

Que foram embarcadas para um reino amigo, na Mauritânia, mas nunca chegaram e os emissários esperaram por dias, meses e anos. 

Pela viagem conta-se que as princesas passaram pelo estreito de Gibraltar, conhecido como um portal sagrado a outras esferas, deixando o mundo real e material para entrar no mundo encantado. No “Rio das Amazonas”, foram despertadas do sono profundo, e encontraram a sacerdotisa Tapuya que chorava a perca de seus filhos: 

“Minhas lágrimas são o Rio.... Eu sou a barreira do Mar (Marajó), Eu sou a Pororoca, defendo meu povo contra a maldade que chega do mar, mas vocês princesas turcas podem entrar nestas Terras, (Recepção da Pororoca). 

Os contadores dizem que elas entraram em uma região elevada onde quem entra jamais pode sair. 

Estes portais e dimensões existem no popular do Maranhão em: 
• Matas 
• Espelhos de água 
• Rochas 
• Cavernas 
• Vários locais e países 

Ninguém sabe o local certo, que pode mudar a todo instante quando assim deseja. 

Alguns estudiosos do Brasil, se baseiam na existência de alguns fatos históricos que afirmam que, no início de 1500 o Espanhol Vicente de Pison, visitou o litoral atlântico do Pará e levou uma grande quantidade de escravos indígenas para a Europa, talvez por estes motivos a Sacerdotisa indígena que recebeu as Princesas Turcas, chorava e chora até hoje transformada em Pororoca. 

Entre os povos da Amazônia representa a Pororoca “Defesa contra estrangeiros”, estes que desejam invadir a cultura e a influência da mata. 

Conta-se que a Princesa Jarina, não estava contente com as matas do Pará e se escondeu na Corte de El Rei Dom Sebastião de Portugal, Mariana voltou ao mar para as esquadras de guerra e Herondina embrenhou-se na mata por ter se identificado com a cultura indígena. 
Entre a lenda e a realidade cultural se encontra as misturas e verdades históricas. 

O Palácio de Dom Sebastião, se encontra a 160 Km de São Luís no arquipélago de Maiaú. 

Sua festa se dá exatamente no dia em que raiou na crôa de cada filho desta linda entidade cabocla; nós cultuamos Dona Herondina no dia 05 de julho de cada ano. Suas cores são a da Turquia, Verde, Amarela e Vermelha, os cabos são verdes e as cristalinas grenás. 

Cantiga - I

No mar tem flores tem rosário de nossa senhora (bis)
Arueira de São Benedito 
Cabocla Herondina chegou nesta hora (bis) 

Mundicarmo Ferret em sua dissertação de doutorado, Desceu na Guma, nos fala que conforme história contada em São Paulo pela Cabocla Mariana, incorporada em Pai Francelino de Xapanã(in memoria), o Rei da Turquia vendo-se quase derrotado em uma batalha, mandou preparar um navio para levar para longe três de suas filhas: Mariana, a mais velha, Jarina, a mais nova e outra cujo nome preferiu não revelar (supostamente Herondina). O navio teve sua rota desviada devido a uma tempestade e naufragou antes de chegar em porto seguro (ou Porto Seguro?). As princesas turcas foram salvas por Rei Sebastião. Jarina, como era muito nova, ficou com ele e passou a ser conhecida como sua filha. Mariana, a mais velha, sendo muito ‘revoltosa’ e acostumada a acompanhar o pai nas batalhas, organizou uma esquadra e voltou para a Turquia mas, chegando lá, recebeu a notícia do fim da guerra e derrota do seu povo - daí a música: 

Cantiga - II
“Fala Vodun, Senhor João de Imbarabaia. 
Prenderam o turco, nosso rei de Imbarabaia. 
Vodun chorou e no romper do dia. 
Desceu na guma, Imperador Rei da Turquia.” (existem várias versões). 

Uma Homenagem da ACALUZ ao Babá Tayandô - Belém do Pará. Que divulgou esta história para o Mundo. Abaixo veremos um vídeo produzido e narrado por ele.

CONHECENDO UM POUCO MAIS DA VIAGEM DOS TURCOS ATÉ A CHEGADA AO BRASIL EM TERRAS DE ENCANTARIA. 

Conta a história que Rei da Turquia era o mais cotado para assumir o comando de um grande império mas, como não era romano, não foi aceito, os romanos, achavam que ele não podia ser rei e os turcos se revoltaram. Começou uma grande disputa entre ele, a família dele e a de Dom Manuel, que era romano. A guerra demorou muitos anos e envolveu muita gente. Havia Dom Francisco, Dom Felipe... Os turcos ganhavam, perdiam, perdiam, ganhavam... Rei da Turquia tinha uma irmã e uma filha muito envolvidas também na guerra. A irmã dele (Floripes) se “perdeu” e ligou-se a grupos diferentes, casou com Guy de Borgonha. A filha era Dodô, Rainha Douro, que era conhecida pelos outros como Joana d’Arc. Ela era vidente - sabia das coisas e avisava o pai e a tia - mas foi acusada de bruxaria. Na guerra, muitos que não eram da família foram ligando-se ao Rei da Turquia e este recebeu todos os que lutaram com ele como filhos. Ao todo, Rei da Turquia teve três famílias: Ferrabrás (a legítima), Borgonha e Ramos. Segundo Pai Euclides (FERREIRA, E. 1989:2), a primeira delas é chefiada pela Rainha Douro (sua filha), a Borgonha é chefiada pela Princesa Floripes (sua irmã), e a Ramos é chefiada por Caboclo Velho. Mas todos os turcos obedecem a seu irmão mais velho, Guerreiro de Alexandria, como também a Tabajara de Alexandria que, atualmente, como ‘invisível’ é o responsável pelo Terreiro da Turquia, no lugar de seu pai (pois, além de ser recebido pelo zelador da casa, assumiu o comando do terreiro após a morte de sua fundadora, que recebia o Rei da Turquia). O Rei da Turquia veio para águas maranhenses no navio encantado de Dom João - de quem era primo. O navio aportou em São Luís e ele foi dar uma volta pelo Outeiro da Cruz (marco da batalha em que os holandeses foram expulsos do Maranhão). Quando voltou, viu que fora atraiçoado por Dom João e que o navio já zarpara. Ficando ali, passou algum tempo andando pelo Outeiro da Cruz (bairro de onde o terreiro da Turquia nunca saiu, apesar de ter mudado de lugar três vezes) e depois afastou-se bastante. Continuando a andar, o Rei da Turquia chegou à aldeia de Caboclo Velho, o índio Sapequara, no Baixo-Amazonas. A aldeia estava em festa e ele gostou muito, achou a festa muito bonita. Caboclo Velho convidou-o a juntar-se a eles e Rei da Turquia resolveu ficar ali com todo o seu grupo. Depois, para serem mais bem aceitos na aldeia, muitos turcos adotaram nomes indígenas - Ubirajara, Tabajara, Jaguarema, Iracema... (Antes eram Francisco, Bartolomeu, Felipe). Rei da Turquia e Caboclo Velho tornaram-se muito amigos, quase irmãos, e cada um adotou filhos do outro. Por isso muitos pensam que eles são irmãos. 

Caboclo Velho já ‘bradava’ nos terreiros de São Luís e os turcos entraram na Mina com ele, como caboclos, apesar de não serem propriamente caboclos. Depois de algum tempo, Rei da Turquia e Dom João encontraram-se (ali?) e tornaram-se amigos - no Terreiro da Turquia um batizou filho do outro, tornando-se duplamente compadres. Numa outra versão do mesmo “mito”, o Rei da Turquia veio com Dom João, mas os dois saíram para um passeio e chegando na aldeia de Caboclo Velho, que estava em festa, o Rei da Turquia gostou da festa e ficou lá, enquanto Dom João foi embora. Conta-se também em São Luís que Dom João foi com Dom José a uma festa na aldeia e o segundo gostou muito da festa e foi entrando enquanto o outro foi embora só - é por isso que Dom José passou a vir (na Mina) como caboclo e Dom João como gentil (C.P. - Casa Fanti-Ashanti - Entrev. 07/1988). Segundo Pai Euclides, o Rei da Turquia tinha três esposas, uma em cada lugar em que guerreou, mas só se costuma falar o nome de uma delas, o da Rainha Leonor. As outras, segundo o mesmo informante, são ligadas ao seu lado português e francês (pois é primo de Dom João e Dom Luís). 



Cantiga - III
“Estava em terra de Mouro, Rei do Mar me chamou. Quem faltou na guma, Rainha Leonor”. 
(FERREIRA, E. 1985:47). 

Como Douro - a filha mais velha do Rei da Turquia, a quem seus filhos mais novos chamavam de mãe - é Joana d’Arc, não é difícil concluir que uma daquelas suas esposas, sobre quem nunca se fala, é francesa. Mas há quem afirme na Mina maranhense que Douro é irmã e não filha do Rei da Turquia. Fala-se também em terreiros maranhenses que a outra esposa do Rei da Turquia é Maria de Alexandria, e que esta é lembrada em uma de suas doutrinas cantadas no Maranhão de forma diferente da que é conhecida em terreiros de paraenses: 

Cantiga - IV
“Para vodum, Senhor João Marambaia, 
Mataram o turco, ficou o rei do Paraguaia... 
Turco chorou, no romper do dia. 
Mataram o turco, senhora Dona Maria”. 

É possível que, para alguns ‘mineiros’, a Dona Maria que aparece na letra da ‘doutrina’ apresentada não seja Maria de Alexandria e sim Mariana, filha do Rei da Turquia que vem também na Mina do Pará como Maria de Mariá (SILVA,A.V. 1976:221). 

Embora haja acordo entre os ‘mineiros’ em relação ao número de famílias do Rei da Turquia, alguns, como Pai Jorge (OLIVEIRA, J. 1989:47), falam que o nome delas é Ferrabrás, Ramos e Mouro (e não Borgonha) e outros como, muito ligada ao Terreiro da Turquia, dizem que as três famílias daquele turco são: Alexandria (e não Ferrabrás), Ramos e Borgonha. Segundo Pai Euclides, talvez os turcos não revelem seus verdadeiros nomes por causa de suas ligações com o paganismo. São conhecidos por nomes que falam de sua origem ou de suas façanhas, A adoção de nomes indígenas foi uma prática muito adotada no Brasil, próximo à sua independência de Portugal, e tem alguma coisa a ver com o romantismo da época. 

Fizemos este adendo ao texto para destacar que as filhas do rei da Turquia, na verdade são adotadas pela Rainha Douro, sendo filhas de um único pai, mas de mães diferentes, tentamos de alguma maneira tentar localizar as supostas mães, e chegamos em três mães, Rainha Leonor (esposa do Rei da Turquia), Rainha Douro (mãe de criação, irmã do Rei da Turquia, a única que podemos afirmar que é mãe de fato, já que criou todos e todas) e Maria de Alexandria, supostamente Maria Padilha Cigana, esposa do Rei da Turquia de origem Cigana e Francesa, Mãe de Herondina apenas. Por este motivo temos uma doutrina que lembra seu lado Padilha, Exu Mulher: 

Cantiga - V
Herondina é moça má 
Deu três gargalhadas no céu... 
Deu três, deu três, deu três gargalhadas no céu.


#ACALUZ 

Ref. 

1.     www.acaluz.com  - 2013 as 16h00 – Adriano Figueiredo, Toy  Nochê Vodun Kaleuan – Nagô Gentil;
2.     David Thomaz Alcântara – Vodunon Tambor de Mina Nagô – 2018 as 11h00.
3.     Mundicarmo Ferretti - Desceu na Guma:  O caboclo do Tambor de Mina no processo de mudança de um terreiro  de São Luís: a Casa Fanti-Ashanti – 1996.
4.     https://www.semeadura.com/news/a-encantaria-amazonica-na-umbanda-parte-ii:-as-tr%C3%AAs-irm%C3%A3s-da-lingua-ferina – 2018 as 18h00.
5.     MOURA, Glória. Batuque no quilombo. Brasilia: FUNTEVÊ, 1988. Nascentes Negras da Música Brasileira - vídeo.
6.     OLIVEIRA, Edilson M. Terreiro de Mina Dois Irmãos, antigo Tambor de Santa Bárbara: histórico. Belém: [(s.n.)], 1990. Distribuído no centenário no terreiro.
7.     OLIVEIRA, Jorge Itaci de. Orixás e voduns nos terreiros de Mina. São Luís: VCR Produções e Publicidades, 1989.
8.     OLIVEIRA, Waldir F. e COSTA LIMA, Vivaldo da (Org.). Cartas de Edson Carneiro a Artur Ramos: de 4/1/1936 a 6/12/ 1938. São Paulo: Ed. Corrupio, 1987.
9.     PEREIRA, Manoel Nunes. A Casa das Minas: contribuição ao estudo das sobrevivências do culto dos voduns, do panteão Daomeano, no Estado do Maranhão-Brasil. 2.ed., Petrópolis: Vozes, 1979. Edição original de 1947. PRANDI.